quarta-feira, 8 de abril de 2009

Refletir - primeira parte

Todas as imagens utilizadas para ilustrar este conto são obras de Eric Zener. Descobri o artista no Mundo de K.



Se perguntassem, ela não saberia responder. Enxergar o céu em poças era-lhe rotina. Jamais erguer os olhos da linha do horizonte era-lhe natural. Ver o resto do mundo no chão era-lhe destino.

O que havia com ela que não a permitia olhar para cima, apenas para baixo? Sua face jamais se voltava ao côncavo azul. Seus olhos somente alcançavam do solo à imagem deles próprios em um espelho na parede. Ela não compreendia e deixou de tentar compreender.



Assim, habituou-se a ter a magnitude acima de si espelhada nos caminhos por onde andava. As chuvas de verão eram as preferidas, preenchendo depressões e sulcos da terra com água que refletia azul celeste e amarelo solar. À noite, abria a janela e espiava o negro apinhado de astros num espelhinho de maquiagem. O maior tesouro, no entanto, era o lago, porque equivalia a uma infinitude de poças ou de espelhos, mas ela não decidia se o lago era uma grande poça ou um grande espelho. Não importava, o que contava era o reflexo.

Um dia, porém, o reflexo se fez insuficiente. Ela queria ser como as outras pessoas, cujos olhos não se restringiam a captar imagens refletidas. Desejava ver o céu sem intermediários (as poças, o espelhinho, até mesmo o lago). Atormentava-a, no entanto, a aparente impossibilidade de vencer sua condição intrínseca. Como olhar para o céu?

Um comentário:

Anônimo disse...

Lindo!
Entendo bem esse sentimento...
Beijão.
Israel