sexta-feira, 6 de março de 2009

Modo, final, esperança e alguém que nem queria ser milionário

Obs: Este post contém spoilers.


Modo, final, esperança.

Posso analisar o que o filme Quem quer ser um milionário? significa para mim a partir dessas três palavras.

Se pararmos para pensar, o enredo do filme é formulaico. Enxugando tudo, temos os seguintes elementos:

a) um rapaz;
b) uma moça;
c) um único amor por toda a vida (ou até os créditos finais);
d) um único amor que encontra obstáculos nas circunstâncias cruéis em que o rapaz e a moça vivem;
e) um único amor que resulta vitorioso afinal.

Deve ser essa a razão por que Isabela Boscov (Veja) e Pablo Villaça (Cinema em Cena) caracterizaram o filme como fábula ou conto de fadas - nomes que nos remetem a histórias de estrutura e conteúdo consagrados e repetidos. De fato, Quem quer ser um milionário? é o resultado de uma fórmula. Contém os elementos ditos acima assim como muitos outros filmes mais bestinhas que estão por aí.

Então, o que o diferenciou para mim? O que o tornou diferente das comédias românticas de que admito gostar?

O modo como a fórmula foi contada. Jamal, nosso herói, participa de um programa de perguntas e respostas no mesmo modelo do Show do Milhão chamado Quem quer ser um milionário? A sabedoria de Jamal, um mero servente em um centro de telemarketing, é questionada. Como pode um favelado chegar à pergunta final do jogo? O pobre Jamal é torturado para que confesse a fraude que outros o acusam de ser. Mas não há engodo algum. Jamal conseguiu responder as perguntas porque realmente sabia as respostas. E as sabia graças às experiências que viveu, reveladas em flashbacks, e que contam a história de uma vida horrivelmente sofrida. Nesses flashes, conhecemos Latika, nossa donzela em perigo, que é, obviamente, o amor de Jamal.


Interessante ainda como o programa Quem quer ser um milionário? é o recurso perfeito para mostrar a determinação e coragem de Jamal de uma forma menos brutal. É um jogo em que, a cada escolha, arrisca-se ganhar ou perder tudo. E foi isso que Jamal fez durante toda sua existência: arriscar tudo em busca do que queria. Desde cedo, sua obstinação é ilustrada ao público em uma cena na qual o ainda menino Jamal se esforça, por meios nada sanitários, para conseguir o autógrafo de um ídolo seu. Assim como, a cada pergunta, ele constrói sua trajetória rumo aos milhões de rúpias, em sua vida cada passo que arriscou o conduziu ao destino que construiu para si mesmo no caminho até então percorrido.

O final desse caminho é empolgante. Uma vez que o filme não era uma dessas comédias românticas de que admito gostar, confesso que ainda senti uma leve apreensão: será que Jamal vai conseguir tudo o que quer? O filme tem desses finais que fazem esquecer a violência e a miséria mostradas e que simplesmente nos fazem feliz. Para mim, só o final já fez valer a pena.

Assim o fez em virtude da esperança dentro de mim. Tenho um ponto fraco, que suspeito compartilhado por muitas pessoas, de adorar ver alguém que foi subestimado surpreender todos. É o sentimento de ver alguém ser gratificado pelo que suportou na vida. É a esperança de ter um final feliz na vida real também.

Não há como não ser cativado por Jamal, por mais irreal que esse herói seja. Possui três características que se complementam no filme: é inteligente, apaixonado e despretensioso. Sua inteligência o fez absorver o necessário da vida para responder aquelas perguntas. Sua paixão o moveu a vida toda. Sua despretensão o fez ganhar um jogo que deveria ser apenas sobre dinheiro, mas que, para ele, significa uma chance de encontrar Latika. Participou de um show chamado Quem quer ser um milionário?, mas nem queria sê-lo.

4 comentários:

Garota D disse...

Eu ainda não viu o filme (mas não por falta de vontade). Estava pensando em algo parecido hoje. Estou lendo o Médico e o Mostro e me veio a mente de que as grandes histórias contadas são repetidas com pequenas variações. Está cada vez mais difícil ver algo original no cinema(remakes e adaptações a torto e a direito) e nos livros.
Compartilho com você o prazer de ver alguém que foi subestimado dar a volta por cima. Acho que é um desejo interno nosso. beijos

Aluízio Loureiro disse...

Raquel, detonou no comentário!!!! Nossa! Lembro da letra da (considerada tola) música da Paula Toller que diz "eu quero ser vc, estar no seu lugar eu quero ter vc, ficar no seu lugar, eu quero ver vc ficar no meu lugar...". Acho que o que nos faz nos apaixonarmos por alguém é o fato de essa pessoa ter aquilo que desejamos ser ou ter e o Jamal cativa exatamente or isso: é apaixonado pela vida, despretensioso e inteligente. CARALHO, Raquel!
Beijo!

Garota D disse...

No problem. Não é o tipo de filme que eu não possa saber o final. Além de que, eu que assisto lost, aprendi que não importa só o spoiler, o bom mesmo é ver a cena.
Beijos

Giovanna disse...

Nooooosa!!! Amei o que vc escreveu! É exatamente o que eu penso sobre esse filme, que me tocou fundo, mas não consegueria expressar dessa sua forma tão inteligente! Oh menina pra escrever bem! Te admiro hein! bjs!