domingo, 18 de janeiro de 2009

Marley & Eu e outros devaneios de fim de noite


Aparentemente, hoje é o dia para escrever sobre coisas não tão novas assim.

Terminei Marley & Eu agorinha. Acho que o livro deve ter um apelo especial para aqueles que são donos de animais, mas não há nada mais de marcante nele enquanto obra literária.

Por outro lado, enquanto história de vida, Marley & Eu é um testemunho de que o cotidiano de cada um de nós é tão rico quanto qualquer cânone da literatura. Há alguns meses, percebi o valor único de cada vida quando parei no meio do meu ambiente de trabalho e lembrei de confidências dos amigos que me rodeavam. Cada um de nós vivencia vários dramas internos, arquiva várias crônicas vividas, tem causos auto-estrelados para contar. Às vezes, imagino o que deve ser a profissão de um psicólogo - ter acesso a tantas vidas desnudas. Pode ser cansativo, mas deve ser intrigante.

Voltando ao livro, é claro que Marley me cativou, mas quem me ganhou de verdade foi John Grogan, o Eu do título. Se John Grogan é o que escreve, ele é gente muito boa. Bom marido, bom pai, bom dono de cão. Adorei a relação dele com a esposa, o amor pelos filhos, sua presença na vida deles, sua paciência e cuidado com Marley. Seus valores são simples, sólidos e bons. Seu novo livro, The Longest Trip Home, é um relato da sua vida a.M. (antes Marley), e desconfio que será minha nova aquisição.

Além de uma leve paixonite pelo autor, o livro me trouxe memórias do Fluf, meu cachorro que morreu em dezembro de 2007. Também comia as coisas mais inadequadas possíveis, desde sabão a borboletas vivas. Tinha o péssimo hábito de se esfregar em qualquer coisa mal cheirosa (lama, etc. etc. etc.) e depois vir com a cara mais sonsa do mundo querendo colo. No sítio da minha avó, adorava correr dentro do açude seco, embrenhava-se no capim alto e surgia aos saltos, ora aqui, ora ali. Na velhice, também ficou surdo, lento e cansado. Diferentemente de Marley, era pequeno, então eu podia carregá-lo quando voltávamos de alguma caminhada. Morreu antes de perder a visão, e por isso fui grata.

Animais de estimação são o tipo de posse que vem com prazo de vida útil. Ao adquirirmos um, sabemos que nos apegaremos a ele, que cuidaremos dele, e que um dia ele morrerá. É irremediável e simples assim. Depois que o Fluf morreu, cogitei não ter mais bichinho algum.

Uma frase no livro, porém, parece ser a moral da história para qualquer relacionamento com um bicho de estimação. É uma frase no livro, porque John Grogan somente repetiu o que o senso comum já ensina: o que vale é a jornada, não o destino. Hoje temos uma calopsita aqui em casa. O destino será a morte. A jornada é vê-la seguir a gente pelos cômodos, assoviar agudamente Atirei o pau no gato, emitir grunhidos que parecem "Bate o pé" e "Raquel", escorregar mechas do meu cabelo entre o bico, esticar-se do ombro do meu pai para se pendurar na armação dos óculos dele, beliscar nossos pés até que a coloquemos na mesa, de onde ela adora derrubar canetas.


Aliás, a frase é uma moral para nossa história de vida também. Quando estive em Teresópolis, um dia resolvi andar pela trilha que conduzia ao início da cachoeira que havia na propriedade. O amigo F. me acompanhou. Logo percebi a diferença no ritmo da nossa caminhada; embora ele tivesse as pernas bem maiores que as minhas, eu ia sempre à frente. Depois vi que ele parava constantemente para observar e comentar a flora, enquanto eu, de cabeça baixa, olhava apenas o chão que se estendia sob meus pés. Se não fosse F. me mostrar que eu tinha de aproveitar também o trajeto até chegar à cachoeira, eu teria seguido sem ver os bambus que ladeavam a trilha e se entrecruzavam acima de nós, um túnel improvisado pela natureza. E F. disse a mesma frase para mim, repetindo sem saber o que amigo H. tinha me dito dias antes.

O que vale é a jornada, não o destino. A jornada implica como chegamos ao destino. A jornada depende da pessoa que queremos ser e das escolhas que fazemos para alcançar esse modo de SER. A jornada significa viver o momento, um dia de cada vez. Venho refletindo que, no meu caso, a jornada mudará quando me destituir de certos reflexos que impedem a visão da coisa em si.

Mas isso é assunto meu e da minha analista.

Enfim, carpe diem.

p.s.
: John Grogan em http://www.johngroganbooks.com/index.cgi

Um comentário:

Garota D disse...

Vou pegar de volta o nosso "Marley e eu" com uma amiga e irei finalmente ler. Eu também passei, recentemente, pela perda da minha gatinha do coração. Era ela única. Só faltava falar. Todo mundo dizia que era igual a mim. :) Foram 12 anos de companheirismo e só guardo as boas lembranças. Penso novamente em criar gatos, mas só quando puder me dedicar a eles, e devo adotar um. São tantos os animais abandonados que dá dó.