sexta-feira, 31 de agosto de 2012

As viagens de agosto

Sei que todo mundo diz que o tempo anda voando. Janeiro estava bem ali, e, mal a gente espera, setembro bate à porta.

Compartilhei desse sentimento até agosto.

Agosto se enlargueceu tanto que pareceu não ter fim. Sério. Era como se, em cada final de semana, coubessem mais sete dias.

É que, quando a gente viaja, parece que a gente acumula mais vida dentro de um ínterim. Quem já não experimentou a sensação? "Parece que a gente tá aqui há uma semana", quando só se passaram, na verdade, dois dias.

Agosto foi o mês das viagens. Iniciamos com Canoa Quebrada. Muito lindo o litoral leste. Parece que a natureza tem mais força por lá.

 

 


Então veio Natal, que eu tinha que conhecer o cunhado, a corujinha & CIA. :o)


E hoje a gente encerra o mês revisitando Lagoinha. A história dessa revisita até que é curta, mas não carece de contar aqui.


Sem falar que, no último final de semana de julho, estávamos em Sobral. Teve uma festa espetacular, teve a mulher do Washington no meio do caminho - digo, avenida -, teve uma turma pra lá de legal. Era o esquenta para o mês que vinha.


Aí repito e desenvolvo: com viagens a gente põe mais vida dentro da vida. Erros e desencontros viram histórias para contar. Acertos e encontros viram momentos para rememorar. A gente aprende um pouquinho de si e do outro em cada viagem. A gente cultiva e colhe.

A gente vive.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

A princesa e os bichinhos de esgoto

Querido diário, 

Sinceramente, não sei o que está acontecendo com o pessoal lá da Vara. Só neste mês, vi dois processos despachados errado (e tive de corrigir os dois!), e outros localizados em escaninhos que não tinham nada a ver com a movimentação processual. Acho que o pessoal está muito desmotivado. Fico pensando no que falar com o S., porque alguma coisa deve ser feita para mudar a situação. 
Caso escrevesse diário, esse seria o texto de cerca de duas semanas atrás. Se ainda me encontrasse na adolescência, tudo o que é pano de fundo psicológico dessa passagem até que seria compreensível. No entanto, já carrego meus trinta anos nas costas, e o tempo que me separa da Ana Raquel adolescente não deu conta de me fazer diferente em um aspecto.

Percebi que, com essa visão da realidade, me coloquei na posição de A Única competente no meu ambiente de trabalho. Ao constatar os despachos inadequados, não repassei os processos para as pessoas que haviam se enganado; pelo contrário, corrigi os erros em silêncio. Desse modo, privei meus colegas, tão capazes quanto eu, da oportunidade de refazer sua análise e reparar o equívoco. Agi como se tudo estivesse nas minhas mãos.

O problema com essa postura foi evidenciado quando uma emoção que raramente sinto porque frequentemente a contenho chegou abalando as estruturas. Raiva. Muita raiva. Desmedida e desproporcional. Até quis colocar a culpa na TPM, mas não deu. A raiva estava ali, naquela dimensão desarrazoada, porque minha prepotência falava mais alto. Sentia que somente eu levava o trabalho a sério. Apenas eu  investia nele apesar da chatice da rotina. Senti muito além do que devia porque me senti muito além do que sou.

Subi num pedestal em alguma época da minha vida e esqueci de descer. Neste exato momento, minha dificuldade em delegar tarefas me vem à mente, e me pergunto quanto dela existe porque penso que somente eu dou conta do recado. Lembro de como assumia os trabalhos em grupo no colégio, de como distribuía meio pesarosa as tarefas entre os colegas, pensando que eu devia ser mesmo a mártir e fazer tudo sozinha pelos outros. Caraca. E cheguei a acreditar que não tinha questões de controle, rs.

Sabe o que é o bom nisso tudo? A vida é uma baita professora. Gostaria muito de aprender lições sem precisar que ela me ensinasse, mas isso raramente ocorre. No caso em particular, além de já estar lidando com a percepção do que se passava, aconteceu que EU errei feio também no trabalho. Então minha colega veio muito tranquila me mostrar o erro, e discutimos qual seria a solução. Simples assim. 

Por último, explico o título da postagem. No segundo ano do ensino médio, assistíamos a uma aula de História quando a professora fez uma pergunta. Bodejei a resposta. A professora, que devia ter curso de leitura labial, entendeu e pediu que eu falasse mais alto. Recusei sorrindo e sem graça. Ela perdeu a paciência e exclamou que não sabia quando eu ia perceber que não era uma princesinha, e o resto da sala, uns bichinhos de esgoto.

Pense numa sacada. Só vim entender quatorze anos depois. 

p.s.: O jeito como comecei esta postagem me lembou este post, que também remete à minha adolescência.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Nós não sabemos ter


Está em todo lugar. Depois de uma tentativa frustrada de relacionamento à distância, uma amiga reencontra, quase um ano depois, o rapaz que a rejeitou. Ela não está mais apaixonada, então evade as investidas súbitas dele. Em virtude disso, eles se desentendem. Ele vai embora para a cidade dele, mas gasta semanas enviando mensagens para minha amiga. Ela própria me escreve uma, dizendo mais ou menos assim: "Homem gosta de mulher ruim mesmo, viu? O fulano agora tá todo apaixonado."

Em outra oportunidade, conversando com uma conhecida, sou apresentada a uma faceta oposta. "Mulher não gosta de homem bonzinho demais," ela sentencia ao me relatar que tinha cansado de uma relação em que o namorado, morto de apaixonado, fazia o que ela queria. Ela terminou, curtiu a vida, mas descobriu  que era com quem ele que queria dividir o futuro. Casaram-se então.

Eis que leio este texto do Ivan Martins, que saiu na semana passada. Depois de descrever pequenos prazeres a dois, ele emenda:

A gente não aproveita o suficiente essas coisas, eu acho. Um tempo enorme do nosso convívio é gasto ralhando com o outro sobre que ele ou ela fez de errado, ou se queixando do que o mundo lá fora fez com cada um de nós. Outra parte imensa do nosso tempo é perdida em tristezas sem razão, em suspeitas sem fundamento, em angústias de origem desconhecida, em culpas que nos perseguem como assombrações sem solução. A gente não gasta tempo suficiente com o corpo do outro, com o coração doce do outro, com a mente inquieta e criativa do outro. A gente não aproveita o outro como poderia, eu acho.     Noites de Inverno, Ivan Martins, Revista Época, atualizado em 1/8/2012.

E aí chego numa conversa que tive com a Pessoa Inteligente há quase dois anos talvez. Porque atravessava outra crise de relacionamento, reclamei da natureza humana quando, injuriada com essa nossa necessidade de caos, perguntei a ela por que cargas d'água a gente precisa sentir Falta. Ela ponderou que o problema não era a Falta. Se parássemos para ver, a Falta move a humanidade. Por causa dEla, saímos do lugar para suprir o que não está lá. A questão naquele momento era outra. A questão é que as pessoas não possuem maturidade para manter o que têm.

A questão é que nós não sabemos ter.

Essa é a verdade por trás da crença popular de que a gente precisa perder para dar valor. Talvez esse pensamento até tenha cruzado sua mente ao ler o exemplo da minha amiga e da conhecida. É claro que há, nesses dois episódios, mais aspectos a ser considerados, como, por exemplo, as relações de poder que foram estabelecidas dentro do relacionamento amoroso dessas pessoas. Mas, lá no fundo, existe também esse problema, esse nosso defeito congênito (nas palavras da Pessoa Inteligente) de não sabermos ter. O carinha não soube ter minha amiga. A conhecida não soube ter o namorado. O carinha e a conhecida sucumbiram a inseguranças, dúvidas e insatisfações em vez de transcenderem a confusão mental e emocional e administrarem o que tinham.

Posso confessar uma coisa? Morro de medo de não saber ter. Morro de medo de desperdiçar uma coisa boa porque não soube administrar o que tinha. Minha estratégia é apreender, nos meus momentos de maior lucidez (que acontecem mesmo é no divã da minha psicanalista), tudo o que me é caro e querido e valoroso. Quando as tormentas chegam, isso me serve de bússola. Tenho a lembrança do que quero manter e vou atravessando a tempestade. Um dia, o céu se abre. Aí a gente curte o Sol que a gente tem.




p.s.: O título desta postagem é também uma adaptação do nome da obra de Marcelo Cândido, Eu não sei ter, editora Virgiliae. Comprei esse livro no ano passado, justamente por causa do título que levava. É uma incursão interessante ao universo masculino.